Cientista, Astrofísico e Negro: Vale quanto pesa (*)

Formar um cientista astrofísico é difícil  e se ele for negro é  muito mais. Uma realidade dura  ainda hoje no Mundo!

     Historicamente a combinação de racismo e a carência de políticas públicas geram a pobreza estatística das pessoas negras (“black people” ou negros(*) que  é atualmente traduzido como afrodescendente) e  impedem o acesso natural dos negros aos cursos com  maior prestígio e pressão nos níveis de graduação e pós-graduação e consequentemente  dificultam, ou impedem quase totalmente o acesso a carreira científica. Inquietações a respeito da desigualdade racial sempre aumenta por esta época de Janeiro, pois  Sempre na terceira segunda-feira do mês,  acontece o feria do dia de Martin Luther King Junior aqui nos EUA.  Martin Luther King , Jr.  Nasceu em Atlanta em janeiro de 1929. Tornou-se um importante líder do movimento de defesa dos direitos civis dos afrodescendentes nos EUA e consequentemente no mundo. Sua campanha diária durante anos foi baseada na não violência e amor ao próximo.  Recebeu o Prêmio Nobel da Paz em 1964, sendo o mais jovem a receber tal reconhecimento. Isto aconteceu pouco antes do seu brutal assassinato. Tal fato fez ecoar ainda mais o seu discurso e suas deias. No discurso ele começa com “Eu Tenho Um Sonho”. 
 Apesar dos avanços o que mudou após 50 anos da morte de Martin Luther King Junior nos EUA (e no Brasil)?

Pouca coisa. Nos EUA vemos a clara evidência nas estatísticas que sugerem o impacto perverso das universidades por uma preferência racial branca. Os frodescendentes são minoritários em todos os ramos da ciência, inclusive na física e astronomia.  Desenvolver e apoiar esforços para aumentar as oportunidades de progressão nas bases do sistema educacional para aumentar seus números e visibilidade do seu trabalho científico é uma prioridade Humana, antes de uma prioridade de estados. Neste sentido a  cada três anos nos EUA, ocorre a conferência do ”National Society of Black Physicists (NSBP)”. Um evento importante e que impressiona por apresentar os números da grande exclusão que ocorre ainda nos dias de hoje. http://scitation.aip.org/content/aip/magazine/physicstoday/news/10.1063/PT.5.9036

  No recenseamento de 2002, apenas 16 dos 3.302 físicos com  doutoramento em algum dos laboratórios nacionais dos EUA eram negros (afrodescendentes). Na astrofísica estelar (e exoplanetas) é ainda mais raro encontrá-los. Dentre alguns poucos que vemos, um impressionante por seu carisma e inteligência é o Astrônomo Gibor Basri que é especialista em atividade estelar e exoplanetas. 

Gibor Basri descende diretamente de escravos da África Oriental que foram trazidos para a Jamaica. O seu pai foi educado no  MIT  aqui em  Cambridge, Massachusetts  e sua mãe na Columbia University  em New York. Um entrevista interessante com Gibor pode ser encontrada no link:  http://www.idvl.org/sciencemakers/Bio26.html


No  Harvard–Smithsonian Center for Astrophysics (CfA) entre outros, tenho trabalho em colaboração  com o Astrofísico e  especialista em exoplanetas John Johnson, que é professor de Astronomia da Universidade de  Harvard e membro do Harvard–Smithsonian Center for Astrophysics (CfA) e afrodescendente.  John obteve seu  PhD na Universidade da Califórnia, Berkeley e é um exemplo vivo das dificuldades e  da luta diária que é  se tornar um cientista-afrodescendente em Astrofísica.   Em conversa com John, fiquei surpreso ao escutar a frase “a situação é agora encorajadora  pois a Astronomia de Harvard aceitou finalmente um estudante afrodescendente em seu programa de pós-graduação este ano  e será  o primeiro em 30 anos ". Segundo John um dos últimos afrodescendentes aceitos na Astronomia de Harvard foi Leonard Strachan, que é físico solar no Observatório Astronômico  Smithsonian (SAO).

Um outro bom exemplo é a cientista de física estelar, com a qual troquei mensagens ano passado e utilizei seus resultados em dos meus artigos de 2015. A   Dr Fabienne Bastien, como ela mesmo se define uma "Black stellar astrophysicist!".  Ela publicou recentemente um artigo na Nature com grande impacto para nossa área onde  explorou dados do satélite Kepler. Ela foi financiada pelo Hubble fellow na Universdade Pennsylvania State.
Foi convidada para pesquisar em Berkeley,  porém achou melhor seguir para outra instituição.




Mulheres negras e cientistas são ainda mais raras e acredite, isso não é por causa da genética, como sublinha o também o astrofísico americano e afrodescendente Neil deGrasse Tyson, autor de diversos livros e que apresenta a série “Cosmos:Odisséia no Espaço“, do NatGeo.  Neil deGrasse Tyson  é  divulgador de ciência mais conhecido em todo mundo. Em um dos vídeos da internet ele dá  uma resposta dura e certeira  quando lhe perguntaram por que não vemos mulheres na ciência. Vale a pena assistir. Alguns dos argumentos servem perfeitamente para os afrodescendentes.

Para saber sobre Cientistas Negros
A lista de grandes invenções provenientes de mãos e cérebros negros é extensa. Na próxima vez  que você utilizar um telefone celular, ar-condicionado, elevador, geladeira lembre-se disto. Algumas da invenções  já foram utilizadas em uma mostra promovida pela Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, ligada à Presidência da República. Cientistas como o filho de escravos George Washington Carver que nasceu numa fazenda no Missouri ao fim da Guerra Civil Americana ajudou a cunhar a história de afrodescendentes na ciência nos EUA.  Quando criança foi sequestrado ao mesmo tempo que ficou órfão. Estudou por conta própria e ainda criança conduzia experimentos biológicos. Foi diplomado mestre na Iowa State Agricultural College, e obteve uma  reputação de brilhante professor e cientista, com resultados importantes  na botânica, agricultura. (TBC)

E no Brasil?

Segundo estatísticas oficiais e acessíveis,  nos últimos dez anos a produção científica nacional integrada em varias áreas crescem  200%, passando de 10 mil para mais de 30 mil estudos publicados em revistas especializadas internacionais (dados do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq do  Ministério da Ciência e Tecnologia), no entanto, paralelo a isto o número de afrodescendente não foi  contemplado por este  salto.  82% dos cientistas negros no Brasil são de formação em ciências humanas (História, Letras,  Sociologia, Geografia, Educação).   Não temos estatísticas formais sobre os Astrônomos afrodescendentes do Brasil. Quantos são e qual sua proporção. (TBC)

A combinação perversa do racismo com a total  ausência de políticas públicas indutoras que quebrem a dificuldade de acesso à educação pública e de qualidade é o principal ponto gerador do atual  cenário.  A baixa autoestima do negro brasileiro está entre os fatores primeiros onde esbarra a carreira e um afrodescendente em cursos que poderiam de entrad  para uma carreira científica.  E em uma sociedade ainda dominada por homens brancos,  a situaçnao das mulheres e mulheres-negras é ainda pior.

A propósito, este artigo surgiu de uma conversa com meu filho e em resposta a pergunta “papai por que não existem muitos astrofísicos negros no mundo?  O fosso é grande, tanto  na UFRN, como em  Harvard ou em qualquer Universidade do Mundo. A ciência ainda tem cor de pele e ela é branca majoritariamente.

E lembre-se, "Astronomia é a porta de entrada para o estudo da ciência" e um grande indicador do  desenvolvimento social e humano em uma sociedade.




Reunido na Universidade de Yale na reunião  EPRV com o Dr. John Johnson, que é professor de Astronomia da Universidade de  Harvard e membro do Harvard–Smithsonian Center for Astrophysics (CfA).  e especialista em exoplaneta.
 
(*) "vale quanto pesa": É a versão brasileira de uma antiga  expressão europeia. No Brasil  na época do comércio de escravos, os homens ganhavam um valor proporcional ao peso, idade e  características relacionadas à sua saúde  força. Devido a isto, nos mercados de escravos  havia sempre balanças disponíveis para avaliar os kilos  da “mercadoria” humana.




Prof. José-Dias do Nascimento Jr.  é   PhD em Astrofísica  pela Universidade de Toulouse  na Françe (1999) , pesquisador visitante do  Harvard–Smithsonian Center for Astrophysics (CfA) e  professor da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. 


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